quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Precisamos fazer revoluções



                    "  Quem estudou no Loyola conheceu Antônio,o vendedor de balas da porta da escola.Quem não fez conta com ele para satisfazer os doces caprichos dos seus filhos?!
                      Mas chegou uma hora em que foi preciso tomar providência.Apesar de muito pequenos,chegamos à conclusão de que o ideal seria estabelecer uma mesadinha ( do tamanho deles),para que tivessem limite com relação " às querências" e, ao   mesmo tempo, para que aprendessem a administrar esse rico dinheirinho.Passamos,então,a lição. E combinamos entre nós, marido e mulher,fazer valer a nova lei.De preferência,sem emenda.Volta  atrás,jamais!
                     Na primeira incursão pelas lojas ( lembro-me bem que foi a  antiga loja de brinquedos Bakana,na Contorno,em frente à Igreja Santo Antônio),Gabriel me pediu para comprar um pacote de figurinhas.Foi necessário relembrar-lhe o combinado.Afinal, tinha sido instituído há pouco tempo:balas,picolés e figurinhas seriam comprados com o dinheiro da mesada.  Então, disse-lhe que emprestaria o dinheiro,mas que ele deveria me pagar depois,já que naquele momento ele não estava prevenido com os cobres na carteira. Esse assunto foi tão discutido em casa que Juliano,meu filho mais velho,quando as parcas moedas da carteira iam findando,dizia que estava ficando "cobre",em vez de pobre.
                   À noite, em casa, já recolhida em meus aposentos,entrou no meu quarto aqule toco de gente mais lindo do mundo.De mãozinha fechada em concha,ele depositou sobre minha mão uma notinha de dinheiro ( das mais amassadas).Na verdade,eu já nem me lembrava da dívida.No entanto,lembro o tanto que doeu aceitar o pagamento.E  naquele gesto,tive a certeza de quanto doía educar.
 ( ...)
                   Imagino que,na cidade de muitos homens de nossa pátria ( tão sem mãe) não havia loja Bakana,nem eles tiveram mesadinha para aprender a lidar com o que era apenas deles,nem bico para lidar com a dor da perda,nem deixaram o  restinho no prato para aprender que existem normas e regras sociais a serem cumpridas.Muito menos existiu por lá um bondoso Antônio,vendedor de balas que,com sua caderneta,creditava a todos nós uma palavra tão em desuso: confiança.
                  Precisamos fazer revoluções.A primeira,certamente,será interna."

 _ Mary Figueiredo Arantes in As preciosas coisas banais.

_ Há anos aprecio e compro as" bijus"  de Mary Design.Recentemente comprei o livro de crônicas escrito por essa artista mineira.Me encantei com todas as suas histórias e com a facilidade com que ela lida com as palavras.Da mesma maneira que lida com pedras,cordas,criando Arte.

           

Um comentário:

  1. Lindo e delicado, nos faz voltar a imaginar ser possível reviver épocas outras, recordo-me com saudades de minha mãe que já se foi e que com dificuldade e justiça me educou, bons tempos esses.

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